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Três exercícios de escrita criativa para passar uma tarde no museu



Encontrei umas vinte pessoas no Museu de Arte de Denver para um workshop de escrita criativa no começo de uma tarde de 2018. Eu era a única estrangeira. Antes de embarcar para os Estados Unidos, eu tinha passado alguns dias buscando um curso diferente de escrita.


Descobri que essa atividade acontecia sempre na última terça-feira do mês. Um professor do centro literário Lighthouse Writers Workshop preparava o roteiro e guiava o grupo. A próxima turma seria exatamente na semana em que eu estaria lá.


Cada participante recebeu uma folha com os exercícios propostos para o dia, além de lápis, papel e uma banqueta para sentar em frente às obras enquanto escrevíamos à mão. Tudo girava em torno da exposição "Like a Hammer", do artista contemporâneo e escultor Jeffrey Gibson.





O workshop criou uma relação diferente com as obras de arte. O primeiro exercício sugeriu que escolhêssemos um dos quadros para descrevê-lo. Era um aquecimento para destravar a escrita. O objetivo era escrever sem julgamentos.


O pior — ou melhor — é que ao reler agora, três anos depois, vejo que funcionou. Fiquei impressionada ao ver que minhas folhas quase não tinham palavras riscadas. Escrevi sem pensar muito, só deixando fluir (quero me lembrar disso toda vez que travar diante de uma página em branco).


A proposta do segundo exercício era escolhermos uma obra com texto escrito — havia várias assim na exposição. A frase seria a abertura do texto. Cada vez que travássemos, deveríamos escrever a frase novamente e seguir a ideia por um caminho diferente.


Escolhi uma obra feita em um saco de pancada. O texto bordado em miçangas dizia "Nossa liberdade vale mais do que a nossa dor". Usei a frase como início de um diálogo de ficção. Nunca escrevi ficção antes; nem depois. Esse é o tipo de magia que acontece quando fazemos um exercício de escrita criativa.


"OUR FREEDOM IS WORTH MORE THAN OUR PAIN", 2017, Jeffrey Gibson

Os exercícios seguintes foram mais específicos, pois traziam trechos de uma entrevista do artista sobre sua arte nos sacos de pancada — os punching bags, em inglês. Ele já fez mais de cinquenta, sempre trazendo referências de sua origem indígena e de músicas que o influenciam.


Ontem achei essas folhas escritas. Percebi que os primeiros exercícios criados para a exposição do Jeffrey Gibson podem ser aplicados em qualquer museu. Ou até mesmo diante de uma obra de arte que encontramos online. Aqui está a tradução de duas questões formuladas pela Lighthouse — e uma terceira que gostei entre várias sugeridas no Museum-Ed.



Exercício 1

Encontre uma obra que chame a sua atenção em termos de cor, textura ou forma e descreva o que você vê. Sinta-se à vontade para descrever o quadro como um todo ou concentre-se em um único elemento — uma parte dele, uma cor, um desenho...


Exercício 2

Encontre outra obra, desta vez escolhendo uma que tenha algum escrito. Use o texto como ponto de partida — como frase de abertura — e comece a escrever a partir daí. Pode ser ficção, não-ficção, diário ou poema. Se você travar, escreva as palavras novamente e vá em uma direção diferente.


Exercício 3

Escolha uma obra que retrate uma paisagem ou lugar. Faça de conta que você está neste lugar escrevendo um cartão postal para alguém. Quais são as imagens, cheiros, sons e sabores ao seu redor? Por que você foi lá? Descreva o que está acontecendo ao seu redor.



Vi no site do Museu de Arte de Denver que eles mantiveram o workshop de escrita via Zoom. Não tem a mesma sensação de puxar a banquetinha diante de um quadro, mas tem orientação e horário marcado — algo tão ou mais importante para evitar o "deixa para depois...".


As duas horas e meia que passei escrevendo no museu estão entre uma das minhas melhores lembranças da viagem. Voltei para o Brasil com vontade de reproduzir o workshop em parceria com um museu daqui. O tempo passou… e a ideia não passou de uma ideia. Mas quem sabe agora inspira outras tardes no museu.



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